Posição da Ordem dos Advogados sobre a “reabertura” dos tribunais
Comunicado do Conselho Geral da Ordem dos Advogados
O Conselho Geral, na sua reunião de 4 de Maio de 2020, analisou a Proposta de Lei nº 30/XIV, que procede, entre outras matérias, ao levantamento da suspensão de prazos e diligências processuais. Em relação à mesma, entende a Ordem dos Advogados referir o seguinte:
- Parece-nos efectivamente necessário que nesta fase se verifique o regresso à sua actividade normal de todos os operadores judiciários, uma vez que os cidadãos em geral e os advogados em particular estão a ser profundamente afectados pela suspensão do serviço público de justiça em resultado da pandemia COVID-19. É, no entanto, imprescindível que para isso se criem as condições necessárias para que a Justiça volte a funcionar em condições de segurança e eficácia.
- A Ordem dos Advogados tem, por isso, sucessivamente apresentado propostas e apelado a que o Ministério da Justiça crie as condições necessárias para que o regresso à actividade dos tribunais se faça em condições de segurança, o que naturalmente passa por garantir que nos tribunais existam equipamentos de protecção para todos os intervenientes processuais e não apenas para os magistrados e funcionários. Trata-se de proteger a vida e a saúde de todas as pessoas que se deslocam a tribunal, o que naturalmente não pode ser equiparado pelo Ministério da Justiça ao fornecimento de papel ou de computadores aos seus funcionários. A Ordem dos Advogados tem, aliás, conhecimento da atitude louvável de alguns Senhores Presidentes de Comarca que procederam à aquisição de materiais de protecção, que disponibilizam a quem não os tenha, protegendo assim todos os que se deslocam ao Tribunal.
- Não nos parece, porém, que esta Proposta de Lei vá no sentido correcto, ao pretender que as diligências que exijam a presença física das partes, seus mandatários e demais intervenientes se realizem através dos meios de comunicação à distância. Efectivamente, a Ordem dos Advogados tem conhecimento, através dos seus representantes nos Conselhos Consultivos das Comarcas, de que têm surgido sistematicamente problemas nas vídeoconferências para a realização de julgamentos. Se tal já acontece quando as referidas vídeoconferências eram apenas utilizadas para processos urgentes, a situação agravar-se-á consideravelmente se as mesmas forem estendidas a todos os processos.
- Acresce que essa forma de comunicação põe seriamente em causa a fiabilidade dos julgamentos, face à dificuldade em controlar se as testemunhas estão a receber indicações externas ou se tomaram conhecimento de depoimentos anteriores. É também extremamente difícil por essa via proceder à exibição e ao confronto das testemunhas com os documentos existentes nos autos, ou proceder à sua acareação, ou seja, para realizar tudo o que é essencial para garantir a fiabilidade de um julgamento.
- Não é, por outro lado, compreensível que os prazos administrativos se reiniciem apenas dentro de vinte dias úteis e o reinício dos prazos judiciais ocorra imediatamente, devendo ser dado igualmente um prazo para que as partes e os advogados tenham tempo para se preparar para o seu reinício.
- Finalmente, não se compreendem as consequências desta alteração legislativa sobre a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade, anteriormente decretada, que deixam de ser consideradas em consequência da revogação do art. 7º da Lei 1-A/2020, o que deverá ser adequadamente clarificado.
- Entende, por isso, a Ordem dos Advogados que se impõe que os Senhores Deputados consagrem na lei o seguinte:
a) Que as diligências processuais devem ser realizadas de forma presencial, sendo os tribunais dotados das necessárias condições de segurança e salvaguarda da saúde pública de todos os intervenientes processuais, sem excepção, o que, a não verificar-se constituirá causa suficiente para a não realização dessas diligências.
b) Que tal como previsto na proposta para os prazos administrativos seja consagrado também um prazo de vinte dias úteis para que a suspensão dos demais prazos seja levantada;
c) Que sejam clarificadas as consequências da revogação do art. 7º da Lei 1-A/2020 sobre a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade.
8. A Ordem dos Advogados solicitará juntos dos grupos parlamentares com assento na Assembleia da República a sua audição com vista à apresentação das referidas preocupações e propostas.
Lisboa, 4 de Maio de 2020,
O Bastonário,
Luís Menezes Leitão
Posição da Ordem dos Advogados sobre a “reabertura” dos tribunais