Amizades entre juiz e advogado

Amizades entre juiz e advogado

Citamos Lexpoint

 

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que deve ser indeferido o pedido de escusa de juiz formulado apenas com base no facto de o mesmo manter uma relação de amizade com o advogado de um dos intervenientes no processo.

O caso

Um juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça pediu escusa de intervir num processo do qual era relator pelo facto de ser amigo de longa data do advogado de um dos intervenientes no processo, no caso o Banco de Portugal, bem como da sua família, tendo participado em projetos conjuntos e tendo o advogado escrito um prefácio para um recente livro que o juiz publicara recentemente.

Apreciação do Supremo Tribunal de Justiça

O STJ entendeu não conceder a escusa, indeferindo o pedido, por considerar que não existia fundamento para a mesma.

Decidiu o STJ que deve ser indeferido o pedido de escusa de juiz formulado apenas com base no facto de o mesmo manter uma relação de amizade com o advogado de um dos intervenientes no processo.

O pedido de escusa ou de recusa de juiz assenta na apreciação do risco de que, em determinado processo, a sua intervenção possa ser considerada suspeita, por haver motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

Imparcialidade que constitui uma garantia essencial para quem submeta a um tribunal a decisão da sua causa. Não obstante, o pedido de escusa pressupõe, e só poderá ser aceite, quando existir esse risco de a intervenção do juiz, nessa situação concreta e individualizada, poder ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave adequado a gerar dúvidas sobre a sua imparcialidade, ou quando tenha tido intervenção anterior no processo fora dos casos legalmente permitidos.

Ora, objetivamente, o facto de um juiz conhecer e manter uma relação cordial com um advogado, tendo conhecido familiares seus, a atual amplificação no espaço público do escrutínio de quem atua em qualquer órgão de soberania ou a circunstância do juiz e do representante de um sujeito processual estarem ligados por uma fraterna amizade, não é suficiente para evidenciar que a intervenção do juiz no processo seja suscetível de criar dúvidas sérias sobre a posição de inteira equidistância.

Relevante para que se considere a suspeição será, antes do mais, a natureza e a extensão do comprometimento do juiz no processo em causa, como juiz natural, que justifique o cuidado e escrúpulo que se tem, para evitar que sobre a sua decisão recaia qualquer dúvida, tanto mais quando não esteja em causa uma amizade com um sujeito processual, mas sim com alguém que intervém no processo a título profissional.

Uma tal relação não pode ser vista, objetivamente, como sendo motivo sério e grave de modo a fazer nascer o receio ou apreensão, razoavelmente fundadas pelo lado relevante das aparências, sobre a imparcialidade do juiz, posto que, essa amizade não é com quem tem interesse de parte mas sim com um profissional do foro.

Assim, não resultando do pedido formulado quaisquer factos que, séria e concretamente, permitam considerar que a intervenção do juiz no processo em causa possa correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave, fundado nessa relação fraterna de amizade mantida com o advogado de um dos sujeitos processuais, que possa gerar dúvidas sobre a sua imparcialidade e assim, através da aceitação do seu pedido de escusa, reforçar a confiança que numa sociedade democrática os tribunais devem oferecer aos cidadãos, deve ser indeferido o pedido de escusa.

Referências
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo n.º 127/19.5YUSTR.L1-M.S1-A, de 6 de abril de 2023
Código de Processo Penal, artigo 43.º

 

Amizades entre juiz e advogado

Contactos

Contactos

Compartilhe