Dispõe o artº 138º do Código Civil, na versão introduzida pela Lei nº 49/2018, de 14 de agosto:
“O maior impossibilitado, por razões de saúde, deficiência, ou pelo seu comportamento, de exercer, plena, pessoal e conscientemente, os seus direitos ou de, nos mesmos termos, cumprir os seus deveres, beneficia das medidas de acompanhamento previstas neste Código”.
É paradoxal a própria ordem das disposições legais:
“Artigo 139.º Decisão judicial
1 – O acompanhamento é decidido pelo tribunal, após audição pessoal e direta do beneficiário, e ponderadas as provas.
2 – Em qualquer altura do processo, podem ser determinadas as medidas de acompanhamento provisórias e urgentes, necessárias para providenciar quanto à pessoa e bens do requerido.
Artigo 140.º Objetivo e supletividade
1 – O acompanhamento do maior visa assegurar o seu bem-estar, a sua recuperação, o pleno exercício de todos os seus direitos e o cumprimento dos seus deveres, salvo as exceções legais ou determinadas por sentença.
2 – A medida não tem lugar sempre que o seu objetivo se mostre garantido através dos deveres gerais de cooperação e de assistência que no caso caibam.
Artigo 141.º […]
1 – O acompanhamento é requerido pelo próprio ou, mediante autorização deste, pelo cônjuge, pelo unido de facto, por qualquer parente sucessível ou, independentemente de autorização, pelo Ministério Público.
2 – O tribunal pode suprir a autorização do beneficiário quando, em face das circunstâncias, este não a possa livre e conscientemente dar, ou quando para tal considere existir um fundamento atendível.
3 – O pedido de suprimento da autorização do beneficiário pode ser cumulado com o pedido de acompanhamento.”
Há, manifestamente, uma inversão da ordem, referindo-se o artº 139º à decisão judicial e artº 141º à legitimidade para o requerimento.
O acompanhamento pode ser requerido nos termos seguintes:
- Pelo próprio;
- Com consentimento do próprio, pelo cônjuge, pelo unido de facto, por qualquer parente sucessível;
- Independentemente de autorização, pelo Ministério Público.
O artigo 143.º dispõe o seguinte, sob a epígrafe de Acompanhante
1 – O acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente.
2 – Na falta de escolha, o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário, designadamente:
a) Ao cônjuge não separado, judicialmente ou de facto;
b) Ao unido de facto;
c) A qualquer dos pais;
d) À pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado;
e) Aos filhos maiores;
f) A qualquer dos avós;
g) À pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado;
h) Ao mandatário a quem o acompanhado tenha conferido poderes de representação;
i) A outra pessoa idónea.
3 – Podem ser designados vários acompanhantes com diferentes funções, especificando-se as atribuições de cada um, com observância dos números anteriores.
Importantíssimo é, como noutros domínios, prevenir.
Dispõe o artº 156º do Código Civil, sob a epigrafe de Mandato com vista a acompanhamento
1 – O maior pode, prevenindo uma eventual necessidade de acompanhamento, celebrar um mandato para a gestão dos seus interesses, com ou sem poderes de representação.
2 – O mandato segue o regime geral e especifica os direitos envolvidos e o âmbito da eventual representação, bem como quaisquer outros elementos ou condições de exercício, sendo livremente revogável pelo mandante.
3 – No momento em que é decretado o acompanhamento, o tribunal aproveita o mandato, no todo ou em parte, e tem-no em conta na definição do âmbito da proteção e na designação do acompanhante.
4 – O tribunal pode fazer cessar o mandato quando seja razoável presumir que a vontade do mandante seria a de o revogar.
Entendemos que estamos perante uma escapatória, não perante uma garantia.
É para nós absolutamente claro que o Estatuto do Maior Acompanhado permite aproveitar as fragilidades do idoso a benefício de terceiros.
Sugerimos aos idosos que se sintam inseguros o recurso ao disposto no referido artº 156º, de forma a evitar que, em caso de necessidade, seja nomeado um acompanhante que possa agir contra os seus interesses.
É importante ter a noção de que o acompanhante pode liquidar tudo o que V. construiu, alegando, em todo o caso, que o fez no seu interesse.
O acompanhante não é remunerado, mas antes o fosse…
Este modelo é, simplesmente, sinistro.