Aprovadas alterações ao regime das associações públicas profissionais

Aprovadas alterações ao regime das associações públicas profissionais

Citamos Lexpoint

 

Foi aprovada no dia 22 de dezembro, na Assembleia da República, a alteração ao regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais (RCOFAP), que inclui novas regras relativas, nomeadamente, a sociedades de profissionais e multidisciplinares, ao órgão de supervisão da atividade exercida pelas associações e à remuneração do estágio para acesso à profissão.

O regime alterado vai aplicar-se às associações públicas profissionais já criadas e em processo de criação.

O Governo vai ainda apresentar uma proposta de lei, no prazo de 120 dias após a entrada em vigor da nova lei, de alteração dos estatutos das associações públicas profissionais já criadas e demais legislação aplicável ao exercício da profissão; vai avaliar, nomeadamente, se os regimes de reserva de atividade em vigor cumprem o disposto no RCOFAP e quais os atos próprios das profissões que se devem manter.

O Executivo vai ainda, no mesmo prazo, rever a lista de profissões reguladas no sentido de a tornar mais pequena, depois de ouvir a Autoridade da Concorrência.

O projeto apresentado pelo PS tinha sido aprovado na generalidade em julho, mas foi depois discutido na especialidade, tendo sido incluídas várias alterações, incluindo a remuneração dos estágios tal como previsto no projeto do PAN, bem como a duração do estágio. O texto final negociado na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão aprovado ontem no Plenário contém alterações face ao inicialmente proposto.

Sociedades de profissionais e multidisciplinares

Nos termos das novas regras, que são as inicialmente propostas, podem ser constituídas:

  • sociedades de profissionais que tenham por objeto principal o exercício de profissões organizadas numa única associação pública profissional;
  • sociedades multidisciplinares de profissionais para exercício de profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais, desde que:
    • a sociedade garanta o cumprimento do regime de incompatibilidades e impedimentos aplicável, bem como de prevenção de conflitos de interesses, devendo, na ausência de medidas que garantam a inexistência de tais conflitos, a prestação de serviços ser recusada ou cessada;
    • os responsáveis pela orientação e execução de funções de interesse público sejam profissionais qualificados;
    • seja garantida a independência técnica, a proteção de informação de clientes e a observância dos deveres deontológicos aplicáveis a cada atividade profissional desenvolvida;
    • a sociedade seja dotada de um sistema interno de salvaguarda de sigilo profissional.

As sociedades profissionais referidas constituídas em Portugal podem ser sociedades civis ou assumir qualquer forma jurídica admissível por lei para o exercício de atividades comerciais.

Podem ser sócios, gerentes ou administradores das sociedades pessoas que não possuam as qualificações profissionais exigidas para o exercício das profissões organizadas na associação pública profissional respetiva, ficando vinculados aos deveres deontológicos aplicáveis ao exercício das profissões abrangidas, designadamente aos deveres de sigilo, quando existam.

A matéria das incompatibilidades e impedimentos é remetida para os Estatutos das associações profissionais. Estes podem prever regras relativas incompatibilidades e impedimentos no exercício da profissão, desde que respeitem o RCOFAP e sejam necessárias e proporcionais ao objetivo de garantir a independência, imparcialidade e integridade da profissão e, caso se justifique, o segredo profissional, aspeto acrescentado na versão final.

Essas regras não possam ser substituídas por alternativas menos restritivas da liberdade profissional.

Matérias definidas nos estatutos 

Os estatutos das associações públicas profissionais são aprovados por lei e regulam, dentro dos limites definidos no RCOFAP:

  • os estágios profissionais ou outros, previstos em lei especial que sejam justificadamente necessários para o acesso e exercício da profissão, mas apenas quando o estágio profissional não faça parte integrante do curso conferente da necessária habilitação académica;
  • o número de períodos de formação por ano, nos casos em que esteja prevista a realização da mesma no âmbito do estágio profissional ou exame, devendo, pelo menos, haver um período de formação por semestre;
  • atos próprios da profissão, quando admitidos ao abrigo dos critérios estabelecidos para a reserva de atividade;
  • categorias de membros, e seus direitos e deveres;
  • o novo Provedor dos destinatários dos serviços.

Relativamente aos estágios e períodos anuais de formação, os estatutos estabelecem o regime do estágio de acesso à profissão ou, sendo o caso, do período formativo correspondente.

Os Estatutos definem a duração máxima do estágio, que não pode exceder os 12 meses (que já se previa), a contar da data de inscrição e até à sua integração como membro efetivo da associação pública profissional, salvo em casos excecionais devidamente fundamentados pela natureza e complexidade da formação a ministrar, a definir nos respetivos estatutos, em cujo caso não pode nunca ser superior a 18 meses ou quando prazo superior resultar de obrigação de direito da União Europeia, aspeto novo que passou a integrar esta matéria.

A inscrição no estágio profissional, quando ao mesmo haja lugar, pode o ocorrer a todo o tempo, iniciando-se nessa data o período de estágio.

Prevê-se expressamente que a organização das fases eventuais de formação e de avaliação dos estágios profissionais é da responsabilidade das associações públicas profissionais respetivas. 

No entanto, a lei pode definir o envolvimento de entidades públicas nos procedimentos de implementação ou de execução do estágio profissional ou regimes de financiamento das entidades formadoras públicas e, sendo caso disso, o envolvimento de entidades empregadoras públicas na realização dos estágios.

Apesar de a definição das matérias a lecionar no período formativo e, eventualmente, a avaliar em exame final, ficar nos Estatutos, a não sobreposição com matérias ou unidades curriculares que integram o curso conferente da necessária habilitação académica é um aspeto definido pelo novo órgão de supervisão.

As eventuais fases de formação devem ser também disponibilizadas na modalidade de ensino à distância com diminuição das taxas a cobrar.

As taxas cobradas durante o estágio profissional ou eventual período de formação obedecem aos critérios da adequação, necessidade e proporcionalidade; os estatutos das associações públicas profissionais devem prever mecanismos de redução, isenção ou diferimento do seu pagamento, em caso de insuficiência económica comprovada do candidato.

Os estágios profissionais são remunerados nos termos a definir nos estatutos das respetivas associações públicas profissionais de acordo com os novos critérios previstos, referidos mais abaixo na notícia.

Foram introduzidas duas novas regras no que respeita aos estágios. 

Por um lado, a avaliação final do estágio é da responsabilidade de um júri independente, que deve integrar personalidades de reconhecido mérito, que não sejam membros da associação pública profissional.

Por outro, estabeleceu-se que as associações públicas profissionais não podem recusar o reconhecimento de habilitações académicas e profissionais obtidas no estrangeiro que estejam devidamente reconhecidas em Portugal ao abrigo da lei, do Direito da União Europeia ou de convenção internacional, nem sujeitar os detentores dessas habilitações a provas, exames, ou outro tipo de condições de acesso que não resultem expressamente das regras em vigor no momento do pedido.

Novas regras para remuneração do estágio

O projeto do PAN foi integrado no futuro diploma aprovado. Prevê-se agora que, sempre que a realização do estágio profissional, ou outro previstos em lei especial necessário para acesso e exercício de uma profissão, implicar a prestação de trabalho, deve ser garantida ao estagiário a remuneração correspondente às funções desempenhadas.

Considera-se que existe prestação de trabalho no âmbito do estágio quando, cumulativamente:

  • existir um beneficiário da atividade desenvolvida pelo estagiário;
  • a atividade desenvolvida pelo estagiário se faça no âmbito da organização e sob a autoridade do beneficiário.

Na determinação da remuneração a atribuir ao estagiário devem ser observados os critérios constitucional e legalmente previstos, nomeadamente em respeito pelo princípio da igualdade de condições de trabalho.

Novo órgão de supervisão

O órgão de supervisão passa a ser obrigatório nas associações públicas profissionais.

É independente no exercício das suas funções, vela pela legalidade da atividade exercida pelos órgãos da associação e exerce poderes de controlo, nomeadamente em matéria de regulação do exercício da profissão.

Sem prejuízo de outras estabelecidas por lei, serão competências do órgão de supervisão:

  • o exercício das atribuições em matéria de estágio, quando o estágio profissional faça parte do curso conferente da necessária habilitação académica (determinação das regras de estágio, incluindo a avaliação final, bem como a fixação de qualquer taxa referente às condições de acesso à inscrição na associação profissional); se fizer cabe na regulamentação estatutária das associações;
  • a verificação da não sobreposição das matérias a lecionar no período formativo e, eventualmente, a avaliar em exame final com as matérias ou unidades curriculares que integram o curso conferente da necessária habilitação académica, após parecer vinculativo da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, a emitir no prazo de 120 dias a contar do pedido;
  • acompanhar regularmente a atividade do órgão disciplinar, designadamente através da apreciação anual do respetivo relatório de atividades e da emissão de recomendações genéricas sobre os seus procedimentos;
  • acompanhar regularmente a atividade formativa da associação pública profissional, em especial a realização dos estágios de acesso à profissão, e a atividade de reconhecimento de competências obtidas no estrangeiro, designadamente, através da apreciação anual do respetivo relatório de atividades e da emissão de recomendações genéricas sobre os seus procedimentos;
  • a supervisão da legalidade e conformidade estatutária e regulamentar da atividade exercida pelos órgãos da associação;
  • a proposta de designação do provedor dos destinatários dos serviços bem como a sua destituição por falta grave no exercício das suas funções, ouvido o órgão colegial executivo.

O órgão de supervisão é composto por um número ímpar de membros a definir nos respetivos Estatutos, incluindo:

  • 40% de representantes da profissão, inscritos na associação pública profissional (eleitos pelos inscritos na associação pública profissional, nos termos a definir nos respetivos estatutos);
  • 40% de membros oriundos dos estabelecimentos de ensino superior que habilitem academicamente o acesso à profissão organizada em associação pública profissional, não inscritos na associação profissional (eleitos pelos inscritos na associação pública profissional, nos termos a definir nos respetivos estatutos);
  • 20% de personalidade de reconhecido mérito, com conhecimentos e experiência relevantes para a atividade da associação pública profissional, não inscritos na associação profissional, cooptados pelos membros referidos, por maioria absoluta.

O Provedor dos destinatários dos serviços é, por inerência, membro do órgão de supervisão, sem direito de voto.

Os membros do órgão de supervisão elegem o Presidente de entre os membros não inscritos na associação pública profissional.

Provedor dos destinatários de serviços

As associações públicas profissionais designam uma personalidade independente, não inscrita na associação pública profissional, com a função de defender os interesses dos destinatários dos serviços profissionais prestados pelos membros daquelas.

Este provedor é designado pelo Bastonário ou Presidente da associação pública profissional, sob proposta do órgão de supervisão, e não pode ser destituído, salvo por falta grave no exercício das suas funções.

Competirá ao provedor analisar as queixas apresentadas pelos destinatários dos serviços e fazer recomendações para a sua resolução, bem como em geral para o aperfeiçoamento do desempenho da associação, sem prejuízo das demais competências previstas na lei ou nos estatutos.

As funções de provedor são remuneradas conforme for regulado no estatuto ou regulamento da associação pública profissional.

A reserva de atividade 

Nos termos do RCOFAP, as atividades profissionais associadas a cada profissão só lhe são reservadas quando tal resulte expressamente da lei, fundada em razões imperiosas de interesse público, de acordo com critérios de proporcionalidade, sem prejuízo da usurpação de funções por exercício de funções públicas, depois de ter sido oficialmente notificada demissão ou suspensão como prevê o Código Penal.

São exclusivamente assegurados por profissionais legalmente habilitados para praticar aqueles atos os serviços profissionais que envolvam a prática de atos próprios de cada profissão e se destinem a terceiros, ainda que prestados em regime de subordinação jurídica. Esta regra não se aplica aos trabalhadores dos serviços e organismos da administração direta e indireta do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, nem das demais pessoas coletivas públicas não empresariais no âmbito das respetivas funções, exceto se a tal estiverem obrigados pelos estatutos das respetivas associações públicas profissionais.

Referências
Projetos de Lei n.º 9/XV/1.ª (PAN) e 108/XV/1.ª (PS) – Texto Final, 21.12.2022
Projeto de Lei 9/XV/1 [PAN], de 29.03.2022
Projeto de Lei 108/XV/1 [PS], de 02.06.2022
Lei n.º 2/2013. D.R. n.º 7, Série I de 2013-01-10, artigos 8.º, 20.º, 27.º, 29.º, 30.º; novos artigos 8.º-A, 15.º-A
Código Penal, artigo 358.º, alínea b)

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